sábado, 31 de março de 2012

31 de março








Preservo teu nome como quem esconde de si mesmo, com medo de ouvi - lo escorrer de minha boca e perder - se ao sabor do vento. Tanto pior que ouça meu chamado piano, sabendo assim que escondo - ou antes tento - um sentimento que é teu por direito.






Que encerro no peito o nome, poucas letras, não aquele que lhe deu teu pai, mas o nome que te arranhava o ouvido desde a minha garganta, vindo de um imo tão íntimo que julguei preciso dize - lo baixinho, na esperança que talvez não me escutasse o indecente apelo, me deixando livre para partir sem hesitar. Preservo teu nome de alheios ouvidos, das línguas que estalam mas não merecem teu desenho evocar: não lhes pertence ou cabe a tua silhueta.


Eu preservo teu nome tão bem, amante, que por vezes acho que ainda estás aqui, que não me levou - te a noite fria e que de fato basta virar - me e abrir os olhos para de novo vê - la. Pena que não possa estar mais longe da verdade. Assim sigo eu de olhos baixos e c'os pés cansados.






Busco voltar a ti pela velha trilha de migalhas e sinto inútil meu esforço. Não posso senão guardar teu nome besuntado em nosso cheiro, que me traz magicamente tudo aquilo que deixei passar. Me preservo dessa forma pois gozo sozinho minha própria escolha egoísta (novidade das novidades!) e não me resignarei a dividir contigo a felicidade que me ofertaras. Caso contrário, sinto, estaria fazendo pouco desse sentimento que me deste por presente.




Não concordas?

terça-feira, 27 de março de 2012

A MAIS NOVA ARTE VELHA





Maldito fuma Plaza, dirige uma Kombi e gosta de falar da vizinha estridente, que arrasta cadeiras
Maldito odeia coisas tolas, mas exibe um poster da Maitê Proença nua sempre que encontra gutierrez
Maldito usa bigode amarelado, camisa desbotada de botão, arrota e peida na frente da mulher
Maldito, certo dia.... meio sem querer, matou um cachorro que comeu uma de suas galinhas, era pra assustar, mas acabou esmagando sua cabeça.
Maldito meio inventivo, resolveu fazer uma arte, pintar quadros com seu próprio sêmen... Maldito foi condecorado em Paris, vendeu muito em Londres, virou mestre, acabou com todos os quadros e surtou. Morreu com dor de barriga, por ter comido dois quilos de linguiça... Maldito virou lenda, foi tido como melhor pintor de todos os tempos do último momento.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Mais Pesado Que o Céu

 Vou comprar cigarros e já volto.

Abrirdes os olhos, ó primatas degenerados!

Faço do erro minha morada. Já nem posso mais rimar meus escritos. Eu só sei do título, o corpo deixou de me pertencer.
A fragilidade vai se agarrando as bordas de qualquer forma de afeto, alimentando o animal feroz do instante. É o pecado na devoção. O altar vazio por debaixo dos lençóis sujos de solidão.
Ídolos foram derribados por canonizar o néscio e o vil.
O herói morreu em uma guerra que jurou não lutar.
O grito é para a multidão surda, que aos beijos com seus amantes, só enxergam as próprias pálpebras.
As narinas suplicam uma altivez inexistente - cuidado com as estrelas! - a ressaca é também moral.
Eu só sei do que vivi. E pois sim, o que vivi, não vivo mais.
E me encontro onde tudo começou: no fim.
O que rodeia... rodeia... odeia. A imperfeição é estimulada pelo desejo da perfeição.
É como esperar o sinal de alguém para descer de um ônibus e ninguém o fazer. Mas é aqui onde desço.
Esperei, na tarde laranja que remetia tanto a infância - os primeiros sabores das coisas - por esperança. E os óculos escuros eram para não me encontrar aos olhos tíbios.
A caneta é como um cano quente de uma arma e o papel minha cabeça.
O devir é interrompido por trepadas. A teoria da liberdade afugenta os sonhos. E o gosto é só de cinzas e batom.

Nossa,como você engordou!

domingo, 25 de março de 2012

Clarear





Tudo que escrevi pra ti morre agora no tumulo fresco da caricata juventude pueril, pingada em avisos de um velho, que sou, permeados pela alma de um sonho, uma vida, da qual só resta a vergonha maltratada pela tristeza de te ver sozinha, crua.
Timidez de um sorriso, felicidade impregnada em falso rancor, morte de um olhar amante, bobeira pra quem vê em dinheiro felicidade, em trabalho um abrigo. Preceito divino, matar pra viver, raiva sim, por amar tanto.

Te transformo, como um artesão, ódio em paixão, aos seus olhos languidos, meço sua dor, mas tú não enxergas em minha raiva o meu amor.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Velho Onófre



                                                  Aqui, qualquer jogo vira clássico
     

Quando via no céu, descendo das estrelas de um lugar escondido com pouco brilho, encostados nos grandes centros de TV, cultura, economia e arte; meio apagado pelo tempo, barrigudo, artista do desbunde, do lsd antigo, da marofa caída, mastigado pelo novo, encontra abrigo num berço carente, abrigo este, que tem como barbante que vira corda, um anti-mofus, regionalis e bigui bitous, como remédio pra tanta afasia, domesticando o povo, divertindo, suprindo; do outro lado da calçada, um bar fechado por velhas chatas, mais músicos desempregados.
O underground recebe Dead fish, a conta gotas, este público, fazendo analogia ao povo etíope, carcomidos pela angustia e falta de água e comida, esperam pelo perdigoto da chuva para se banharem e beberem, assim como o capixaba espera por um novo velho vanguardista, escondido, apagada e meio repetido... voltar, para assim, nos deleitarmos, unidos, de mãos dadas com a sua divertida arte derrocada irei amar.

quarta-feira, 21 de março de 2012

ORAÇÃO





O valor das coisas está no valor que a elas damos. Um livro roto cheirando a velharia, uma maçã meio mordida, um velho cacoete arremedado em carinhoso escárnio. Ou ainda um poema bobo, poema fraco, mas que é o teu poema. Poema todo teu. Pois vinde a nós o nosso reino e seja feita a nossa vontade (no princípio, agora e ) sempre. Esta seja a tua oração.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Quid Pro Quo

Dois, para mim, é barroco.

Hoje o dia é nublado e da tua cama não vejo nada além de cinza. Nas tuas costas, com a ponta de um dos dedos, escrevo um nome, que perpassa as dobradiças da tua janela e beija a boca quente de um passado nem tão passado assim - como um rabisco no canto de um papel em uma aula maçante; como uma inspiração notívaga, que por preguiça não tomas nota, na confiança de que no amanhã ainda viverá na memória.
Sempre vi vilãs as pessoas que me afligiam. Mas será que não sou eu o antagonista, vivendo da ventura do que sinto por dentro das calças?
A tua respiração me agulha como trompetes e fliscornes nos ouvidos de um cão. Cão que ladra na noite silenciosa para ouvir como resposta o eco de seu próprio latido. E assim fico, tentando fazer todo o céu lá de fora caber na ponta do meu polegar, enquanto o teu corpo me queima a pele neste frio cortante e o cheiro forte de suor do teu travesseiro me inquieta.
Ponho tudo em pratos limpos, faço a mesa, mas não quero ouvir o tilintar dos talheres. Porque me lembra uma festa que esqueceram de me convidar: um banquete para poucos, onde a essência tira o gosto de indústria dos alimentos, onde não há espaço para a sobremesa.
E como sói acontecer, parto, sabendo que voltarei, pois esqueci meus cigarros na sua varanda de onde me assistes partir sem um sorriso sequer.

Nada como uma boa desordem pondo as coisas no lugar!

"Amigo", o descartável.




Clemente, outrora ausente, aquele que vê o que qualquer ser, o mesmo, te traz algum sabor, pouca cor. Médio rival, vem por meio do mesmo arranjo, arranjar brio, arranjar ludibriosos elogios.
Paralítica, limitando-se ao momento de um brinde; triste ternura, pouco pra ser doce ou amargo, inusitado, algo quem confia, palatável pras loucuras e luxurias por sempre conectada embriaguez, destaca-se pelo vento contra tédio, declina-se logo depois, acabará feito um maço de cigarro.
Pouco reluzente nos circuitos pontiagudos deste começo corrido, petrificado, rico em poucas palavras e doses homéricas de diversão, não vai te curar da depressão.
O mundo é retroceder, rever e reveja, faça o mais novo sujeito novo, como novo produto novo, mais um membro valioso, como um teto ou banco receptivo e sacro.
Pra ser jovem... mais um amigo novo, mais uma carta voa...

... Que assim falando pensas

Mergulhar no que não é meu é, de longe, meu esporte favorito. Escafandrista do alheio: essa minha arte. Aparatado eu parto ao fundo do que está dentro de ti, do outro e vou bem ao centro de tudo e de todos. Essa partilha é a única forma que sinto digna de pertencer a esse mundo. Seja dor, seja carinho, todo tipo de afeto é feito matéria viva das fossas em que chafurdo feliz pela angústia de buscar novos sentidos ao que chamam vivência.


E se não isso, o que? Se não os etéreos garranchos, eternos rascunhos que somos, o que há além do ponto final? Será no fim tudo memórias? Sempre lembranças, como se sabe, muita vez daquilo que sequer foi de fato? Vamos recordar que as impressões que tivemos, momentos mal gravados nas páginas amareladas da lembrança, não passam exatamente disso que são, ou seja, gravações. Matrizes? Não. Não, não, não, não, não.

Cópias ou pastiches, melhor dizendo.

E é aqui nessas linhas que deito as idéias (vindas de tuas entranhas mas por mim digeridas) para que sintas comigo. Que goze comigo do que juntos sentimos, tempo presente ainda que ido. Sinta minha voz te vibrar por dentro, minha língua escorrendo em teu canal auditivo, tua lágrima canalizada através do meu suor. Por que sentir e morrer é o que nos define vivos. É o que nos torna humanos.

sábado, 10 de março de 2012

A Artemis





De tudo quanto brilha na noite, nada ofusca mais que Diana. Em seus tons dourados espalha, clara, o cinismo de quem te ri o riso largo e rasgado numa hora pra na seguinte virar - te a face.



Se, somente se (cabe aqui algum pensamento de ordem lógica?) te faz por ela se acarinhar, certo é, pobre louco, para mais fácil te devorar. Por isso tão gorda, redonda matrona.






* * *




Tudo para ela é Prata, não te enganes. Nauseabunda e lívida vive de cercar - te e ainda crês nisso um sinal de submissão. Ora não sê tão insano, caro amigo! Que de longe controla a caçadora, muiraquitã ao colo, cada passo e todo ciclo. Vestida de preto é ainda mais bela e perigosa, a Dama do Brumário.



Ria, pois, amada minha, minha amante. Ria da minha demência. Sou presa fácil de Selene, Cíntia... Como todo homem, sou tua caça.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Espectro


Deambulando por avenidas largas, no ritmo lento de quem não tem muito aonde ir, vê - se descabido quixote arrastando seus metais: indolentes lamúrios em angustiante sinfonia. Pois segue invisível nosso maestro ao som de buzinas e sirenes, alheio a todos os presentes.

Em verdade digo que não fosse a nuvem de dejetos que forma a passagem desse fátuo ente, nenhum vestígio de sua pífia existência ficaria para trás a evocar sua triste condição de morto em vida. Segue aabrindo caminhos (destino incerto) com sua carruagem de sonhos foscos onde é ele cocheiro de si mesmo. Transita entre mundos que nada lhe dizem. Nada têm a lhe oferecer além da escória... não lhe dizem respeito.

sábado, 3 de março de 2012

Crescido

Meus delírios já não passam de uma febrezinha!

Na fresta da porta entreaberta via-se luz, aurora, coisa que acalentava as noites púberes de sonhos e incertezas que se faziam certezas na convicção do que se era sem ser. Era luz baixa, de vela acesa, que iluminava sem nitidez, soporífera, onde se execrava o chão sem mesmo tocar. Injúrias à terra erosiva da lua.
Mas doravante e insofismável, porta aberta está - completamente - e não se sabe dar sinônimos à esse clarão. E já não falha o gosto de chão, que no horizonte já se embaralha com o céu.
Isso é artifício do tempo que é artimanha do fado que se dança com os malditos vícios - escapismos - pendurados nas costas. E dói. Pisa-se em expectativas como papel. E a felicidade toma formas espinhosas. Tudo é falta, não sobra.
Mas esse é o caminho natural das coisas, certo? As invariáveis subversivas já não passam de nostalgias em mesa de bar. E tudo aquilo que fora referência não anda um centímetro nas estantes.
O velho é o novo. Aquela conversa maturada de "quando tiveres minha idade" vai se fazendo presente, tomando corpo, o teu.
Agora o desejo é não se ver só, numa caixa de vidro, aconselhando a juventude de que aquilo é passageiro como o trem que se precisa pegar para o trabalho.
O que se espera é alguém com um beijo de primeiro encontro e o abraço mais robusto do mundo - firme como o quê? - Que alivía o azedume do dia, interpelando, em juras de amor, como o mesmo fora.
Assim, a dança vai ficando menos dolorosa. É para quando a música parar. 

Bem que vovô me falou!