segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Tempo nos amores vagam.





Quando Zé encontrou Maria o mundo já não era tão simples, a ordem não estava sobre a mesa e as informações eram tantas que a menção em refletir era apenas um momento de escapar. Quanto custa estar ao seu lado, pensa Zé; o amargo dissabor de flutuar sob holofotes das diferenças e contrastes que os padrões podem causar. O músculo que rompe essa condição é o mesmo que o torna motivado a tentar e testar. Zé, por vezes pego pela agonia das perdas de outrora, envolvido pelo gozo da perspectiva, a espera paciente e ingênua da pulsante energia insurgente em suas letras, encontra o que nelas refletem o nirvana, ressurgindo no bem estar de viver. Tomaria várias cervejas com você, pensa Zé. Tão simples quanto o nome de ambos, paradoxal ao universo que habitam, eis que emerge o natural e inequívoco sentimento, ambíguo como bem e mal (Nietzsche) tomando posse do homem: Amor.


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Passaram-se tempos


- Quando me descobri magro, me descobri opaco, com suas formas perdidas, seus voos desastres. Antes de começar a me repetir, começo a me iniciar no pleonasmo, como prova de meu amor por você, como tal clichê. Quando me via em ti, pedia o chão, pois o que mais queria era ter o reinicio constante desta torpe paixão. Nos momentos sitiados pela incerteza, vislumbro o porto seguro do seu coração; mas o gozo chegou ao fim. Inicio minha casa, eterno recomeço, todos os caminhos dão no almoço e jantar; ao acordar, ao estudar e labutar. Torto sentido de estar, tosco modo de estarem, todos partindo daqui, todos com custo de vida, todos com peso do mar, todos perdidos sobre morte, todos revisam a parcela da dor e pulsam regendo o pavio aceso a queimar.



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Paralelas






                                                                                                         
-Então você fala em reciprocidade?
-Absolutamente. As pessoas não são iguais, ponto pacífico.
-Mas todo homem nasce livre...
-Todo homem nasce preso a um Estado e a um status de sexo, Cep, credo,
classe, fenótipo...
-Muito me assombra que você fale em seres humanos melhores que os outros.
Digo, isso é - Tapo sua boca secamente com um olhar de reprovo
-Não. Não falo em melhor ou pior. Diferentes. Não se pode comparar o que é
diferente.

O silêncio constrangedor inunda a sala como se as geleiras eternas do
Ártico derretessem de súbito. São vinte anos comendo no mesmo restaurante.
Vinte anos é muito tempo. Ainda  sem graça, ele faz um gesto ao garçom.

-Sempre achei que você estivesse numa de pacifista, de bem com o
Mundo e sempre de peito aberto - retoma o assunto entre goles do recém chegado 
conhaque. São vinte anos de vida conjunta, e ainda assim as vezes é como se comer com um estranho.

-Tente manter o peito aberto o tempo todo. Veremos quanta estocada consegue aturar.
Oh, claro. Não feche demais a guarda, campeão. Uma ou outra porrada te ajudam a 
amaciar a carne, e pode ser até que seja surpreendido com um ou outro abraço.

-Clinch.

-Como?

-Chama - se clinch, esse abraço. Não passa de uma manobra para ganhar tempo e cansar
o adversário.

Dessa vez sou eu no canto.  O próprio Ali, grande o bastante pra ser o maior, já se viu derrotado um dia, uma abelha já cansada demais para ferrar. O mesmo passou - se com Foreman, com 
Frazier, nossa! Mesmo Tysson com toda sua ira um dia se tornou obsoleto. Como acabou acontecendo, aliás com o próprio esporte.

-O pugilismo já não presta mais pro mundo de hoje - atalhou como que lendo minha mente. Também pudera. Cúmplices de tanto tempo...

-Não é violento o bastante, verdade? Não depois do Vale tudo. 

-MMA é como chamam hoje em dia. Não que um nome vá mudar muito as coisas, heim?

Rimos satisfeitos por ainda concordar com algo. A primeira vez aquela noite. De todas as evidências, a certeza de que a intimidade de sempre e o carinho de ambos seguia incansável pela longa e sinuosa estrada. Estrada essa seguida a passos lentos, os olhos mais e mais cansados e gentilmente cultivadas as perenes dores de estômago.

É quando a porta do restaurante faz tilintar o pequeno sino. As poucas quatro, cinco almas do escuro lugar se viram pra recepcionar esse visitante recém chegado do frio mundo exterior, que ora se acaba em chuva. 
Canivetes, chovendo canivetes. Os feliz cansaço agora se reparte em três. Allan, o garçom, traz o copo num automatismo prenhe de ensaiada cortesia. Sabe que essa noite será longa, e a gorjeta, por pouca, ainda assim pingará.

-Como vão as senhoras? - Diz, com aquele risinho cínico e o cigarro entre os dentes. Apalpa os bolsos em busca de fogo, como se a essa altura chama ainda houvesse que a nós acalantasse. Bom, de todos ele sempre foi o mais patusco, espírito
mais juvenil, como fosse assim um Bute. É isso, uma entidade sempre pronta a rir de você com a graça e frescor de um Marlboro de menta e arsênico. Antes que ache o isqueiro, qual Prometeu, lhe acendo o cigarro e com a confiança que nos rendeu uma vida conjunta regada no álcool, pego um pra mim de seu maço. 
Como agrada ver lugares que resistem as mudanças de um mundo que nos morre pra renascer mais careta e certinho, ascético e hipócrita. Não é em qualquer lugar fechado que se pode fumar hoje em dia. OK, ninguém frequenta mais o velho Tony's. E é por isso que o amamos tanto.

Trago a fumaça fundo como um suspiro e retomo a discussão, feliz por estar mais uma vez com vinte e poucos anos:

-Falávamos da amabilidade humana, do MMA
-De sanduicheiras populares, de fornos para a massa
-Da boa vontade Universal, lembra? Onde cada um cuida do próprio cu? onde gente feliz não enche o saco?
-Porra, Zé! Você é sempre tão romântico!