sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

A vida irrita a arte

Fitter Happier by Radiohead on Grooveshark



 

http://aprendendosobreouniverso.blogspot.com.br/2013/12/sagittarius-b2-nuvem-de-alcool.html


"A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro", disse o homem cujo whisky era seu melhor amigo 







   No começo há dor como numa gastrite. Arde um pouco, incomoda mas a gente acaba se acostumando. Só que a coisa vai crescendo, crescendo, florescendo, como um câncer. Engraçado! A vida é como um câncer que nos mata de tanto crescer. Morremos de tanto viver. Maldita vida, tão bela e miserável, 
 tão cheia de vida e tão apontada pra morte, seu último e único alvo, que impressiona acabar assim, de repente. Não, mais que de repente. E é por isso que bebo.




***


    Bebo a vida pra engoli - la tal qual um dia a terra há de fazer comigo.  Dia em que enfim serei útil e me hei de tornar adubo, esterco, merda que é a vida, quente e úmida. Prenhe de tudo que é sujo e belo, do que foi e do que há de ser. Hidrôgenio, carbono, nitrato, a vida que abunda em tudo e vem de eras infinitas, das entranhas das estrelas, do cosmo, feitas de luz e bosta. Em tudo há os mesmos elementos, esculpidos a bósson de higgs e magia, ignorância nossa que acreditamos em tudo que nos dizem as religiões, os jornais e o Discovery Chanel. Maldito seja Darwin. 




   E é por isso que eu fumo. Pra trazer na boca o gosto de cinza e pó do que somos na  realidade, aspirar a divindade indivisível que a tudo circunda e alimentar minha cálida, digo, morna, vida, digo, Câncer. Trago a trago, dia após dia, maldito seja o calendário gregoriano e seus meses intermináveis.


  Maldito seja o cristianismo, maldita a 7x7, esse 3x 4 da minha insatisfação proletária e madura, que me estampa ao rosto a mácula do quando e onde nasci, maldita minha insatisfação pueril de a   tudo imputar uma culpa pra além de meus atos e aspirações. Maldito seja o homem e maldita a mulher, maldito tudo que nos congrega enquanto degredados filhos de uma velha cadela. 


Maldita seja a cadeia alimentar onde estamos abaixo apenas dos vermes. Maldita arte de reclamar de tudo e de acordar no dia seguinte, ressaca nebulosa, querendo ainda mais e mais. Por fim, maldita folha em branco onde dessangro e disfarço tudo que não me pertence, e por isso devolvo a quem interessar possa. Maldito seja o dia em que folha em branco deixei de ser, para ser apenas um borrão derramado sobre o espaço prometido, palestina de papel.


                                            Como no princípio, agora e sempre.